28 de janeiro de 20229 minutos ler

Alteração ao regime da propriedade horizontal e do condomínio

A Lei n.º 8/2022, de 10 de janeiro, altera o regime da propriedade horizontal, introduzindo alterações ao Código Civil, ao Decreto-Lei n.º 268/94, de 25 de outubro e ao Código do Notariado.

Estas alterações entram em vigor 90 dias após a sua publicação, em 10 de abril de 2022. A alteração relativa à representação do condomínio em Tribunal é imediatamente aplicável aos processos judiciais em que seja discutida a regularidade da representação do condomínio.

De entre as alterações introduzidas destacam-se as seguintes:

Alienação de Fração Autónoma – “Declaração de Não Dívida”

A alienação de frações autónomas passa a ter um novo documento instrutório que é obrigatório para a celebração do contrato definitivo de alienação, por escritura pública ou por documento particular autenticado.

Trata-se de Declaração escrita que, a solicitação do condómino que pretende alienar a sua fração autónoma, deve, nos 10 dias seguintes, ser emitida pelo Administrador de Condomínio. Nesta Declaração terá que constar o montante de todos os encargos de condomínio que sejam referentes à fração autónoma a alienar, com especificação do seguinte:

  • da natureza dos encargos;
  • dos montantes e dos prazos de pagamento dos encargos;
  • de que não existem dívidas ou que existem dívidas ao condomínio, com indicação da natureza, dos montantes em dívida e das datas de constituição e de vencimento das dívidas.

A alteração ao Código de Notariado alarga o conceito de alienação (que foi inserido na alteração ao Código Civil) para “instrumentos pelos quais se partilhem ou transmitam direitos sobre prédios”.

O adquirente da fração autónoma pode, de forma expressa, declarar (na escritura pública ou no documento particular autenticado) que prescinde desta Declaração. Neste caso o adquirente aceita a responsabilidade e a obrigação de pagar ao condomínio os valores das dívidas ao condomínio referentes a data anterior ao da sua aquisição.

Esta Declaração constituiu-se como uma alteração muito relevante a nível da alienação de frações autónomas, com impacto no clausulado dos Contratos Promessa de Compra e Venda e que exigirá as devidas cautelas sobre a Declaração a ser emitida pela Administração de Condomínio, incluindo a nível de legitimidade.

Despesas com as Partes Comuns

Os condóminos que são os proprietários das frações autónomas no momento das respetivas deliberações são responsáveis pelo pagamento das seguintes despesas na proporção do valor da respetiva fração autónoma:

  • Despesas necessárias conservação e fruição das partes comuns do prédio urbano e
  • Despesas relativas ao pagamento de serviços de interesse comum.

Porém, as despesas relativas ao pagamento de serviços de interesse comum (ii) podem ficar a cargo dos condóminos em partes iguais ou em proporção à respetiva fruição, desde que, cumulativamente:

1. Resulte de disposição do regulamento de condomínio, aprovada sem oposição, por maioria dos condóminos que representem a maioria do valor total do prédio;

2. Estejam devidamente especificadas;
e

3. Estejam devidamente justificados os critérios que determinam a sua imputação.

Caso o estado de conservação de uma parte comum que esteja afeta ao uso exclusivo de um condómino venha a afetar o estado de conservação ou o uso das demais partes comuns do prédio, o condómino que a usa em exclusivo apenas suporta o valor das respetivas despesas de reparação na proporção do valor da sua fração autónoma, salvo se tal necessidade de reparação decorrer de facto que lhe seja imputável.

Reparações Indispensáveis e Urgentes

A lei passa a definir como indispensáveis e urgentes “as reparações necessárias à eliminação, num curto prazo, de vícios ou patologias existentes nas partes comuns que possam, a qualquer momento, causar ou agravar danos no edifício ou conjunto de edifícios, ou em bens, ou colocar em risco a segurança das pessoas”. Mantém-se a regra de que estas reparações podem ser executadas, na falta ou no impedimento do Administrador de Condomínio, por iniciativa de qualquer condómino.

Assembleia de Condóminos

A Assembleia de Condóminos continua a reunir-se na primeira quinzena de janeiro para a aprovação de contas respeitante ao último ano e para a aprovação do orçamento anual. No entanto, a Lei passa a prever que esta reunião se possa realizar, excecionalmente, no primeiro trimestre de cada ano, desde que essa possibilidade esteja contemplada no regulamento de condomínio ou resultar de deliberação dos condóminos que seja aprovada por maioria.

As convocatórias para as Assembleias de Condóminos passam a poder ser enviadas por correio eletrónico para os condóminos que manifestem essa vontade, o que deve ficar a constar em ata de anterior reunião da Assembleia de Condóminos (com a indicação do respetivo endereço de correio eletrónico do condómino). Uma vez recebida a convocatória por e-mail, o condómino deve enviar, pelo mesmo meio, o recibo de receção do respetivo e-mail com a convocatória.

É estabelecida a possibilidade da reunião da Assembleia de Condóminos realizar-se através de meios de comunicação à distância, preferencialmente por videoconferência. Caso algum dos condóminos não tenha, fundamentadamente, condições para participar na Assembleia de Condóminos por estes meios e tenha transmitido essa impossibilidade à Administração do Condomínio, compete a esta assegurar-lhe os meios necessários, sob pena da Assembleia não poder ter lugar através daqueles meios.

As atas das Assembleias de Condóminos devem obedecer ao seguinte:

  • Têm que ser redigidas e assinadas por quem nelas tenha intervindo como presidente e têm que ser subscritas por todos os condóminos presentes;
  • Têm que conter um resumo do que de essencial se tiver passado na reunião, indicando, designadamente, a data e o local da reunião, os condóminos presentes e ausentes, os assuntos apreciados, as decisões e as deliberações tomadas com o resultado de cada votação e o facto de a ata ter sido lida e aprovada;
  • A assinatura e a subscrição da ata podem ser efetuadas por assinatura eletrónica qualificada ou por assinatura manuscrita, aposta sobre o documento original ou sobre documento digitalizado que contenha outras assinaturas. A Administração de Condomínio deve definir a ordem de recolha das assinaturas ou de recolha das declarações por via eletrónica, para as assinaturas ficarem a constar de um único documento (a “subscrição” é a declaração do condómino - enviada por correio eletrónico para o endereço da administração do condomínio - em como concorda com o conteúdo da ata que lhe tenha sido remetida pela mesma via, declaração esta que deve ser junta, como anexo, ao original da ata);
  • A ata em que se delibere o montante das contribuições a pagar ao condomínio tem que mencionar o montante anual a pagar por cada condómino e a data de vencimento das respetivas obrigações.

A ata de Assembleia de Condóminos em que se delibera o valor das dívidas dos condóminos mantém-se como título executivo para demandar judicialmente os condóminos que tenham dívidas ao Condomínio. Passam a poder constar no título executivo (para além do valor em dívida):

  1. os juros de mora determinados à taxa legal;

  2. as sanções pecuniárias, desde que aprovadas em Assembleia de Condóminos ou previstas no regulamento do condomínio.

Funções do Administrador de Condomínio

As funções do Administrador de Condomínio passam a incluir o seguinte:

  • Verificar a existência do fundo comum de reserva;
  • Emitir Declaração de dívida ou de não dívida do condómino, no prazo de 10 dias, sempre que solicitado;
  • Intervir em todas as situações de urgência, convocando de imediato Assembleia Extraordinária de Condóminos para ratificação da sua atuação;
  • Apresentar, pelo menos, três orçamentos de diferentes proveniências para a execução de obras de conservação extraordinária ou que constituam inovação, que tenham sido deliberadas em Assembleia de Condóminos (esta regra pode não ser aplicável se estiver prevista uma regra diferente no regulamento de condomínio ou por deliberação da Assembleia de Condóminos);
  • Informar os condóminos sempre que o condomínio for citado ou notificado no âmbito de um processo judicial ou outro;
  • Representar o condomínio em Tribunal, como demandante ou como demandado, agindo no exercício das suas funções, como representante da universalidade dos condóminos ou quando expressamente mandatado pela Assembleia de Condóminos;
  • Apresentar queixas-crime relacionadas com as partes comuns do prédio sem necessidade de autorização da Assembleia de Condóminos;
  • Prestar informação semestral sobre o desenvolvimento de qualquer processo judicial ou outro;
  • Instaurar ação judicial destinada a cobrar as quantias em dívida pelos condóminos (incluindo juros e sanções pecuniárias), obrigação que o Administrador deve cumprir nos 90 dias seguintes ao incumprimento do condómino (salvo deliberação em contrário);

O Administrador de Condomínio que não cumprir com as suas funções (decorrentes da lei ou de deliberações da Assembleia de Condóminos) é civilmente responsável pela sua omissão, sem prejuízo de eventual responsabilidade criminal, se aplicável.

Dever de Informação e Comunicação dos Condóminos

Os condóminos passam a estar obrigados a cumprir com o seguinte:

  1. Informar o Administrador de Condomínio do seu número de contribuinte, morada, contatos telefónicos, endereço de correio eletrónico e respetivas atualizações de dados;

  2. Comunicar a alienação da fração autónoma por correio registado expedido no prazo de 15 dias a contar da data da alienação, comunicando o nome completo e número de contribuinte do novo proprietário, sob pena do condómino alienante ser responsabilizado pelas despesas inerentes à identificação do novo proprietário e pelos encargos suportados com a mora no pagamento dos encargos que se vencerem após a alienação.

Alteração ao Título Constitutivo de Propriedade Horizontal (PH)

A falta de acordo na alteração do título constitutivo de PH quanto às partes comuns pode ser suprida judicialmente nas situações em que se verifique cumulativamente o seguinte:

  • os votos representativos dos condóminos que nela não consintam (votos contra) sejam inferiores a 1/10 do capital investido; e
  • a alteração não modifique as condições de uso, o valor relativo ou o fim a que as frações autónomas se destinam.
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